A mentalidade brasileira da gestão dos bens públicos, herdada da monarquia, se reflete nas práticas abusivas dos três poderes, liderando está o Judiciário. Mas não nos leva a lugar bom algum, ficarmos somente reclamando. Ou cada brasileiro pratica os instrumentos democtáticos ou tudo continuará piorando e os três poderes distribuindo condicionando à massa de brasileiros a se comportar relativamente passiva e a aceitar esmolas sociais como um espécie de recompensa por se deixar ser manipulada. Vamos acabar com essa mentalidade de vêz. Cada um por sí: Não vote em candidato que não se compromente expressivamente a combater a corrupção de forma impiedosa e nem em candidato a reeleição que não possui histórico de combate à corrupção. Eu mesmo não votarei, se não houver candidato comprometido com o combate impiedoso à corrupção. Precisamos urgentemente de políticos que nos ajudem a alcançar esses objetivos aqui >>>
O NZZ titulou e sub-titulou seu artigo assim:
“Luxo e clientelismo: como a elite judiciária brasileira abusa de seu poder”

“Juizes e promotores brasileiros desfrutam de privilégios consideráveis, mas permanecem vulneráveis à corrupção. Isso enfraquece a reputação do Judiciário e a confiança na democracia.”
A seguir, o conteúdo do artigo do jornal suiço, cujo link está bem abaixo, depois do artigo traduzido, tradução livre:
“Imagine o seguinte cenário na Suíça: um juiz do Supremo Tribunal Federal convida advogados para um grande encontro anual em um resort de luxo no Caribe. O convite inclui não apenas metade do tribunal e várias dezenas de advogados renomados, mas também políticos, conselheiros governamentais e altos funcionários públicos. O evento, com duração de vários dias, é patrocinado por empresas clientes dos advogados ou cujos casos estão atualmente em andamento no tribunal.
Exatamente isso acontece no Brasil a cada ano, quando Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), o mais alto tribunal do Brasil, convida para um evento em Portugal. Mendes é o decano da corte, ou seja, o juiz mais antigo. O homem de 69 anos fez seu doutorado em Münster. Ele é a eminência cinza da justiça brasileira. No já 12º Fórum Jurídico, realizado em junho, 300 palestrantes participaram. Esperava-se a presença de 2000 participantes. O evento tem como coorganizador o Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa, que pertence a Mendes e sua família.
Os juízes são convidados pelos réus
Não é possível determinar quanto os patrocinadores gastam com aperitivos e jantares exclusivos, mas deputados, senadores e altos funcionários têm suas despesas de viagem e custos cobertos pelo estado. Alguns dos juristas de alto escalão viajam, ainda, com seguranças – às custas do estado, é claro.
Conrado Hübner, professor de direito público na Universidade de São Paulo, critica o evento como um “grande encontro de lobby”. O Supremo Tribunal se defende com uma declaração breve, afirmando que o evento não gera custos para a corte. Em outras palavras: os procuradores e juízes são oficialmente convidados por aqueles que estão acusando ou condenando.
Não há preocupações sobre recebimento de vantagens por parte dos juízes mais altos. O juiz Luís Roberto Barroso defendeu o evento, dizendo que o tribunal fala com todos os setores da sociedade. Em Lisboa, a vez era dos empresários.
60 dias de férias por “excepcional estresse”
Bruno Carazza, jurista e economista, trabalhou por muito tempo no serviço público. Agora, ele publicou um livro: o primeiro volume se chama “O País dos Privilégios”, e dois outros volumes devem seguir. Carazza afirma que a mentalidade de “autossuficiência” prejudica não apenas a imagem da justiça, mas também a democracia como um todo.
Isso porque o STF tem se mostrado um guardião da democracia recentemente. Tanto nas tentativas do ex-presidente Jair Bolsonaro de declarar as eleições de 2022 ilegais, quanto na invasão do complexo governamental por seus apoiadores após a eleição perdida, o STF teve um papel importante. No entanto, o nepotismo e a aceitação de vantagens tornam o tribunal vulnerável a críticas.
Carazza descreve em detalhes como juízes e procuradores, ao longo dos 36 anos da democracia brasileira, ascenderam a uma elite de servidores públicos que desfrutam de salários elevados e privilégios como os da corte portuguesa de antigamente.
Benefícios e férias “extraordinárias”
Juristas no serviço público têm 60 dias de férias por ano, o dobro dos trabalhadores brasileiros. Os magistrados, como são chamados os juízes e procuradores, justificam isso pelo estresse excepcional. No entanto, o estresse não impede a maioria dos 30.000 juízes e procuradores de vender uma parte significativa de suas férias. Ao invés de descansar, eles continuam trabalhando, recebendo tanto o pagamento de férias quanto o salário regular, e ainda um terço a mais do salário como adicional de férias. E tudo isso sem impostos.
Devido ao grande número de períodos de férias, os colegas frequentemente se substituem uns aos outros. Isso garante a eles um aumento salarial de um terço. Juízes recebem adicionais para moradia, alimentação, transporte, vestuário, funeral, tratamento dentário. A cara assistência médica privada no Brasil para toda a família está inclusa. As filhas e filhos têm as despesas com creche, escola e universidade até os 24 anos cobertas.
10.000 francos para joias e sapatos são insuficientes
Há três anos, o Tribunal de Contas obrigou o judiciário a listar todas as ajudas de custo existentes. O resultado foi uma relação de 68 subsídios, ajudas e compensações.
O crescimento desmesurado das benesses deve-se ao fato de que o teto salarial para servidores públicos é, por lei, igual ao salário de um juiz do STF. Ninguém pode ganhar mais do que um juiz do Supremo. Isso equivale a cerca de 7.000 francos por mês – enquanto a renda média no Brasil gira em torno de 300 francos.
No entanto, para a maioria, isso não é suficiente. Recentemente, uma procuradora se queixou de que, com seu salário, ela mal conseguia comprar joias e sapatos. Ela depende da renda do marido para manter seu padrão de vida.
Juízes e procuradores inventam constantemente novos subsídios isentos de impostos que funcionam como aumentos salariais. O resultado: 93% dos juízes e procuradores ganharam em 2023 mais do que um membro oficial do STF.
O custo da justiça brasileira
A mentalidade de “autossuficiência” da elite jurídica faz com que a justiça no Brasil custe, em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), mais de cinco vezes o valor da justiça na Suíça. No Brasil, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os custos correspondem a 1,6% do PIB, enquanto na Suíça, segundo a Comissão Europeia para a Eficiência da Justiça, são apenas 0,28%.
A “corrida do ouro” no Judiciário após Lava-Jato
“Para defender seus interesses, os juristas agem como um cartel”, afirma Carazza. Bruno Brandão, da Transparência Internacional (TI) no Brasil, vive isso na prática. Constantemente, tribunais tentam dificultar o trabalho da organização. “Os custos com advogados estão se tornando uma parte crescente do nosso orçamento”, diz Brandão, também membro do conselho da TI. A organização está presente em 110 países. Não é raro que autoridades se oponham ao trabalho anticorrupção da TI, mas é raro que isso venha de altas autoridades judiciais – e quando ocorre, é em países autoritários.
Juízes e procuradores resistem fortemente quando alguém tenta fiscalizar seus atos. Brandão sugere um encontro em um pequeno café em São Paulo, onde ficaria fácil perceber se alguém o estivesse seguindo. Ele observa com desconfiança qualquer um que se aproxime.
O escândalo de corrupção Lava-Jato mudou a justiça no Brasil, afirma Brandão. “Há uma verdadeira febre do ouro no Judiciário”. O escândalo envolveu grandes empreiteiras, a estatal Petrobras e muitos políticos. A partir de 2014, advogados se beneficiaram da avalanche de processos contra seus clientes, acusados de corrupção. Muitos desses réus confessaram e se tornaram delatores.
Inicialmente, os juízes de Brasília apoiaram as investigações de corrupção no caso Lava-Jato. Porém, logo começaram a surgir nomes de juízes do STF nas listas de empresários corruptos como beneficiários das ações. Quando os próprios juízes começaram a ser investigados, bloquearam as investigações. Então, o STF anulou as sentenças – com argumentos questionáveis, mesmo diante de provas e confissões claras de todos os envolvidos.
Os juízes tornaram-se uma casta intocável
Desde então, o negócio para advogados se tornou extremamente lucrativo. Com as sentenças anuladas, são pagas comissões sobre o sucesso. As firmas de advocacia envolvidas rapidamente acumulam honorários na casa das centenas de milhões de reais, diz Brandão.
Isso também beneficia alguns juízes e procuradores. A elite da justiça brasileira, que estudou nas mesmas universidades e pertence aos mesmos grupos sociais, mantém estreitos laços. Todos sabem quais cônjuges, filhos ou parentes de juízes do STF trabalham como advogados nas firmas que lidam com os casos no tribunal superior. É praticamente impossível provar que um juiz é corrupto, mas sua família se beneficia dos veredictos.
Esse nepotismo se tornou algo comum, observa um influente advogado econômico em São Paulo, que prefere não se identificar. “A percepção da justiça como uma casta intocável está crescendo rapidamente.”
Foi o caso, por exemplo, do juiz supremo Ricardo Lewandowski, que considerou totalmente normal ser contratado como consultor jurídico pela holding J&F poucos dias após sua aposentadoria. Essa holding sempre foi investigada por corrupção no Supremo. Um ano depois, Lewandowski retornou ao serviço público e, desde fevereiro, é Ministro da Justiça no governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O ex-líder sindical também nomeou seu advogado pessoal, Cristiano Zanin Martins, para o cargo de juiz supremo.
O problema, segundo Brandão, é que ninguém controla os juízes. Os tribunais criados para fiscalizar a justiça se tornaram, na prática, grupos de interesse da elite judicial.”